Descansa

Pode descansar. Dizia notando seu esforço em se sentar com a coluna reta tendo todo aquele espaço da cama para se deitar.

“Não, assim tá bom”, respondia. Então, como uma mãe quem cuida da filha, encostei as mãos nos ombros dela, impulsionando-a com o corpo para trás para que finalmente pudesse relaxar.

Deixando-se levar pelo toque, gemia “Ahhh que delícia”. E só então se permitia descansar sentindo o tecido macio do travesseiro.

A protagonista foi uma das primeiras cabeleireiras de Guarulhos, à frente do seu tempo, decidiu fazer curso e empreender, sempre aparentou ser uma mulher forte, mas, antes disso, era só uma menina que saia de casa ainda de madrugada para a labuta da roça.

O tempo passou, ela cresceu, aprendeu de tudo um pouco, sabia cozinhar, lavar, passar e costurar, entendia sobre os segredos para fazer as freguesas felizes e assim criou suas três filhas do jeitinho que pôde, com seus erros e acertos, sempre dedicada.

A pequena grande mulher investiu na terra, trabalhou duro, benzeu, plantou, sujou a barriga no fogão. Lembro-me de sua bolsa preta comprida e de um caderninho de caligrafia bem guardado. Naquelas folhas, escrevi algumas palavras para ensiná-la a compor novas frases. “Fia, passa lição para mim”, pedia. Mal sabia que a aprendiz da história não era ela...

Hoje descanso com a brisa do vento e na mão, o copo de caipirinha enquanto sinto o frescor da grama entre os dedos dos pés. Na água gelada, as crianças brincam jogando bola. Sabe, a paisagem por aqui continua bonita. As flores mais delicadas me lembram do seu perfume e as cores rosadas são como seu batonzinho.

O retrato atual é fruto da tua semente.

Somos gratos.